ESPIRAL
- por Eliane Oliveira
25/06/18
Ele me pediu que desenhasse sem intencionar. Lápis de cor
e giz de cera. Folha branca. Escolhi as cores. Quatro cores de cada. Comecei.
Espirais, estrelas e pontos gordos entre linhas paralelas. Deixei-me ir como se
estivesse possuída por mim mesma que não conheço. Espirais, espirais, mais
espirais. Espirais. Quando me dei conta, reparei no desenho que imagens
estranhas e intensas se projetaram. "Devo ser muito doida",
avaliei-me com a minha velha amiga sombra virginiana do meu sol em peixes (com
todo o peso do preconceito que a ideia de 'doida' tem )". Preocupei-me
comigo. Seriamente. Quis saber se só eu tive essa impressão. Compartilhei com
amigos e pedi sua opinião. O olhar do outro sobre meus secretos desvarios
inconscientes agora revelados me interessava. Diante do desenho, fora os que,
levando na brincadeira, avaliaram que realmente meu caso era grave, houve quem
se arriscou a palpitar. Alguém disse: "O seu desenho parece um céu
diferente, meio espaço cósmico". Hummm... Espaço cósmico é bom. Trouxe-me
algum sentido ao sem sentido. Significar é o que fazemos para humanizar o
inexplicável, o misterioso, o inominável. Espaço sideral da alma é uma forma
bonita de significar a minha alma. Gostei. Mais leve. Planetas, estrelas e
galáxias em mim e eu nelas. Imagem parecida com outro alguém que disse que havia
percebido elementos de festa junina no desenho. Bom também. Um ambiente
festivo. Festa junina da alma. Alma em festa, com fogos de artifício estourando
no ar.
Mas, ainda intrigada, e considerando que o episódio se deu
no contexto de uma aula de psicologia junguiana, tive que ver o que Jung falou
sobre espirais. Jung estudou os símbolos do inconsciente, arquétipos, imagens
eternas sempre havidas na alma de todos os seres porque expressam o próprio
movimento da vida. Aprendo pra aprender o que sempre soube (mas não sabia que
sabia ou sabia que sabia mas nem sempre me lembrei). Olhe para o voo das
gaivotas no céu. Olhe para o DNA. Olhe para o caracol. Olhe como se abrem as
flores. Olhe como murcham as flores. Olhe como crescem os galhos das árvores.
Olhe para o giro dos planetas. Olhe para a forma dos tecidos. Olhe para sua
orelha. Olhe para um feto no útero. Olhe para uma concha no mar. Olhe para o
dia e para a noite. Olhe para inspiração e para a expiração. Olhe para a vida e
para a morte. Um ponto que cresce de fora pra dentro e de dentro pra fora. Olhe
para todas as formas labirínticas. Meu corpo, mesmo quando aparentemente
estático, faz um movimento ondulatório. Isso me acontece sempre e mais
nitidamente quando estou praticando yoga. Meu corpo balança mesmo quando parece
parado. Os antigos mestres yogues descreveram a circulação da energia
serpentina, rodeando os chakras (centros de energia), ligando as polaridades do
ser, de cima pra baixo, de baixo pra cima, para fora e para dentro. Se você
abrir seu corpo, não verá os chakras nem a energia passar por eles. Se quiser
ver pra crer, não crerá porque não verá. Mas, isso não é coisa que se crê, mas
coisa que se sabe, como diria Jung quando perguntado sobre a existência de
Deus: "Eu não acredito. Eu sei". Citei Jung pelo contexto de onde
essa reflexão foi suscitada, mas essa sabedoria é arquetípica (sempreviva),
está em muitas tradições, nas mais antigas tradições, sem registro histórico,
como a tradição do Humano, da natureza e do cosmos, as mais antigas dentre
elas.
Sem conclusões. Sem respostas. Sem fim. Segredos da alma.
Festa-no-céu-junino-sideral. Círculo primordial. Estou no redemoinho de
Dorothy, que me leva para o estrada dos tijolos amarelos, que não vão dar em
lugar nenhum senão em mim mesma, que sempre estive e de onde nunca saí. Shiva.
Força transformadora. Caminho da individuação. Movimento das marés. Encontro
comigo mesma que sou o outro em mim. Se sou o outro em mim, então eu sou o
outro. Sou todo. Espaço Cósmico. Do centro para fora para o centro para fora
para o centro. Doido? Amor - Beleza - Gentileza - Riqueza - Natureza. OM
Espaço Uddiyana Yoga - Rua Almirante Tamandaré, 66/525 - Flamengo RJ
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