O PIANO EM MINHA VIDA: PAIXÃO E MEDITAÇÃO
(Texto e vídeos da Profa. Eliane Oliveira)

















 

Não sou uma pianista, mas toco piano desde os 12 anos de idade.

Tocar piano sempre foi para mim uma forma de meditação. Quando toco piano, param os meus pensamentos. Sou tragada para dentro da música. Não há mais “eu”. Só a música. Eu sou o instrumento dela. Sou o seu piano. Não sou eu quem a toco mas ela quem toca em mim. Ela toca-se a si mesma através de mim. Meu corpo é apenas um canal por onde ela passa. Empresto minhas mãos, braços, respiração, olhar, coração para ela passar. Tocar piano é uma experiência de entrega, de fluxo, de confiança. Você deve se deixar conduzir, se quer que a música seja.

Obviamente que, antes de deixá-la fluir livremente através de você, é fundamental saber tocá-la. Para isso, existe a técnica. É preciso estudar a partitura. É preciso exercitar os dedos com escalas e arpejos. É preciso repetir os movimentos muitas vezes. É preciso treinar a música insistentemente. É preciso voltar naquela parte da música que lhe exige mais atenção dada sua dificuldade. Isso sempre. Há uma mecânica. Há um trabalho. Mas, paradoxalmente, se se quer ouvir a música, após ter aprendido a técnica, deve-se abandonar a técnica. Quero dizer com isso: a técnica estará lá porque foi assimilada pelo corpo, mas não se pode pensar mais nela. Inicia-se o tempo da alma, quando a música se revela, para além de você mas com você. Algo espiritual.

Lembro-me que, ao longo do tempo, o piano e a música que toquei nele foram para mim tal como um mestre (ele) para seu discípulo (eu). Exerceram sobre mim uma função terapêutica, senão a própria cura através da arte. Pois, ao tocá-lo, era possível acessar áreas profundas da alma onde moram minhas sombras. A alegria, a tristeza, o prazer, a raiva, a saudade, matérias tão sutis, podiam ser, dependendo do caso, potencializadas ou expurgadas. Foi assim, por exemplo, toda vez em que estive apaixonada. Nunca consegui estar apaixonada sem tocar piano, ouvir música e fazer poesia. Ainda mais se o amor não era correspondido. Aí mesmo é que a música e o piano cabiam como a minha forma de expressão mais visceral.

E, foi por causa do coração doído fruto da frustração de um amor que não se desdobrou como eu pensei que se desdobraria que, recentemente, em janeiro deste ano (2016), trouxe o piano para morar comigo no meu apartamento. Ele, o instrumento –- um Essenfelder - nem sempre viajou comigo na minha jornada de vida. Ficou hospedado na casa dos meus pais em alguns períodos, e eu só tocava ao visitá-los. Mas, não tive dúvidas de trazê-lo para perto de mim agora. Era urgente. Estava apaixonada por um homem que não me correspondia, e, para acolher e transmutar minha tristeza, era preciso conectar minha essência e permanecer no meu centro, fechar os olhos, aquietar a mente e confiar. Meditação feita com a música ao tocar piano. Sobretudo quando tocava as doces linhas melódicas, dissonantes e polifônicas de Johann Sebastian Bach. Há nelas beleza, densidade e verdade, feito poesia. São vozes que parecem ser a minha e a de um outro, dialogando, encontrando-se, entregando-se, misturando-se, entendendo-se, amando-se. A vivência pura da não dualidade. O encontro e a dissolução de dois no Todo. 
 
Sim, professoras de Yoga também se apaixonam e vivem oscilações de sentimentos e pensamentos. Mas elas conhecem também maneiras de voltar para o seu centro. Aprenderam essas maneiras com os antigos mestres através de outros mestres, e hoje ensinam essa sabedoria ancestral aos seus alunos, como se elas (professoras) fossem instrumentos musicais da Música (a sabedoria ancestral). Quanto mais praticamos Yoga, conectamo-nos com nossa essência, aquilo que está além do ego e que descansa tranquilo em nós: a felicidade. A felicidade já está realizada dentro de nós, mas somos tão ignorantes dessa verdade que passamos toda a vida procurando por ela lá fora. A prática do Yoga, progressivamente, nos deixa cada vez mais sensíveis e perceptíveis da vida abundante que temos pulsante em nós. Yoga é ele próprio meditação. Equilibrando corpo, mente e espírito, mais nos sentimos realizados e desejamos viver a vida com Vida. Adquirimos e/ou aprofundamos a consciência de que podemos experimentar o mundo com plenitude, integrando tudo o que somos. A arte é um caminho para esse autoconhecimento. Somos todos múltiplos em talentos. A Criação É em nós. Se acreditarmos nessa plenitude da alma, ela será livre, leve e solta. Feliz como ela já é.

Tudo é como deve ser. Acredito e confio que era pra ser exatamente o que foi, do jeito que foi, no limite do que foi.  No limite que foi, foi bom. Guardarei na memória a boa lembrança, o carinho e o respeito por aquele homem. Agora, é preciso continuar o caminho. Sigo, como Deus quer. Fluir, sem brigar com a vida.

Salve a saudosa Dona Maria Luisa Lima, grandiosa pianista e minha eterna professora de piano. Ela ainda está comigo me ensinando toda vez que toco (In Memorian).

Salve meus pais pela sua forte musicalidade e pelo incentivo aos filhos na vivência da música!

Salve meus mestres de yoga (em especial Prof. Paulo Murilo Rosas, com quem aprendi o Dakshina Tantra).

Salve todos os músicos e artistas, em especial o saudoso pianista, companheiro e amigo Alan Warszawski (In memorian +1995-2010).

Salve a Música! 

Salve o Amor!

Salve a Essência! 

OM Sarasvatyai Namah!

Namastê! 

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eliane.martins.oliveira@gmail.com 

 
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