O CAMINHO DA ACEITAÇÃO
Duas
chaves muito simples, porém difíceis de serem colocadas em prática,
constituem os fundamentos da não-dualidade:
1-
Esforçar-se para estar aqui e agora, do jeito que é.
2-
Ser uno com o que está sendo, do jeito que é.
Lembrem-se
que as impressões negativas e dolorosas do passado ganham força,
seu impacto sobre nós, justamente porque não conseguimos dizer sim
a elas, aceitá-las e, portanto, os acontecimentos são reprimidos e
rejeitados. Por esses mesmos motivos, é o passado que nos impede de
estar aqui e agora, de nos desapegar.
Encontramo-nos
então na presença da palavra-mestra de nossas vidas, verdadeiro
pilar de nossas vidas: a aceitação.
Dizer
sim ao que está sendo, aceitando até o inaceitável ou o
inevitável, é algo que se encontra em todas as tradições.
Os
mestres Zen dizem "parem de se opor". O que corresponde a
ver e reconhecer. Para poder dizer sim ao que é, é necessário
dizer sim ao que foi. Aceitando retrospectivamente os
acontecimentos negativos do passado, os conflitos e as dualidades se
dissipam, os vestígios do karma se apagam.
Numa
primeira fase, para muitos de nós e conforme a gravidade dos
acontecimentos, a aceitação é insuportável, chocante, e pode ter
uma conotação moralista, sendo assimilada à fatalidade ou à
resignação. Não se preocupem, esse principio da aceitação é uma
ciência, a ciência da não-dualidade. A aceitação, a adesão, a
não-dualidade com relação ao inevitável (do dois nasce o
sofrimento) acontecem aqui e agora, sem nenhuma consideração em
relação ao futuro: ISSO É. O que está sendo, é; o que não
está sendo, não é. Isso sendo, isso é; isso acabando, isso acaba.
Mas
a aceitação não implica em nenhum compromisso para o futuro, nem
bloqueia a ação. O futuro fica aberto, a ação permanece. Vocês
poderão notar que a adesão ao que é faz desaparecer a emoção,
porque quando nos situamos no aqui e agora, nos situamos na
REALIDADE. Essa atitude de não-conflito que tende para a
supressão das emoções leva a uma ação lúcida, não viciada por
uma revolta ou recusa.
-
Sim, recebi más noticias; não, eu não deveria tê-las recebido;
sim, estou terrivelmente angustiado; não, eu não deveria estar
angustiado.
Somente
o "sim" é verdadeiro: sim, estou sofrendo; sim, estou
angustiado; sim, recebi más noticias, sem nenhum "não".
Quando não posso aceitar o acontecimento, a má noticia, a emoção
nasce.
A
emoção não é criada pelo fato em si, por mais penoso que seja,
mas pela recusa do fato, a coexistência do sim e do não. Essa
emoção que não existia antes é fadada inevitavelmente a
desaparecer. Visto que houve um começo, deve ter um fim. Nenhuma
alegria, nenhum sofrimento, podem durar eternamente. A emoção
nasce, se desenvolve e morre, salvo se impedirmos seu curso natural.
É isso que fazemos quando não aceitamos as coisas tais como elas
são.
Pelo
contrário, agarramo-nos a emoções positivas, agradáveis, para
fazer-las durar e fazemos tudo para aniquilar as emoções negativas
e os sofrimentos no intuito de ignorá-los. Jamais esqueçam que a
mais forte angústia, o medo, o mais insuportável pânico, a
impressão de eventos com teor de pesadelo, o desespero, a certeza de
um impasse total, têm apenas uma realidade relativa e são
destinadas a dissipar-se.
A
paz interior, a harmonia em si, passa pela aceitação sem limite do
seguinte fato:
.:
Não procurar mais fazer durar o positivo e não rejeitar, negar as
emoções negativas.
.: Aceitar plenamente que as emoções positivas não duram e que as emoções negativas estão aqui.
A
adesão deve ser sem nenhuma reserva ou reticência. Trata-se
simplesmente de deixar as emoções negativas e positivas seguirem
seu curso e recebê-las como a expressão da manifestação
universal.
Na
verdade é difícil dizer "sim", aceitar todas essas
emoções negativas.
Talvez
o primeiro passo, também o mais difícil, é a aceitação de si:
como eu sou, do jeito que sou, e apreciar-se.
Aceitar
não é se resignar.
Se
resignar é curvar-se em face de uma fatalidade, um golpe do destino,
circunstâncias adversas. É uma atitude passiva, permanece presa ao
passado e nos dissocia mais e mais à medida que o tempo passa. Num
plano psicológico corresponde ao suplício medieval do
esquartejamento. Aquele que se resigna gostaria que as coisas
acontecessem de forma diferente, mas sentindo-se impotente, abandona
e abaixa os braços. A resignação contém, então, duas recusas: a
recusa da realidade e a recusa da ação. Exatamente o contrário
da aceitação. A resignação suporia que a Manifestação é rígida
e que as coisas não mudam.
Aceitar
o que é, é aceitar a mudança, a transformação, a evolução.
Resignação só poderia significar querer fazer durar o que não
dura.
Portanto
a aceitação é bem o contrário da resignação, porque o que é
plenamente aceito, perde seu poder e desaparece. Ao passo que o
que é negado é rejeitado, e subsiste num estado potencial.
Quanto mais recusamos, mais o que é recusado ou rejeitado ganha
força.
Temos
que compreender que a página está virando constantemente a cada
milionésimo de segundo.
Há
também a conscientização de que nunca poderemos ser completamente
preenchidos; que procuramos sempre preencher um desejo infinito, um
vazio infinito com coisas finitas.
Aqui
temos a aceitação da carência, que essa carência nunca será
preenchida por posses, haveres, relacionamentos, aventuras amorosas,
nem pela família, comunidade, igreja ou partido político.
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